Bem estar de ruminantes - Animal Welfare Indicators

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BEM ESTAR ANIMAL

Bem estar de ruminantes Ana Vieira, Inês Ajuda, George Stilwell , AWIN – Animal Welfare Indicators Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Técnica de Lisboa [email protected]

O bem-estar animal é um dos principais tópicos de interesse a nível da produção animal moderna, estando de forma consistente no topo das preocupações levantadas por consumidores e políticos da União Europeia. Prova disto é o facto do bem-estar animal ser parte integrante da política europeia "do prado ao prato" e uma das estratégias prioritárias relacionadas com o desenvolvimento de políticas mais sustentáveis de produção de produtos de origem animal. O QUE É O BEM-ESTAR ANIMAL? Do ponto de vista científico, o bem-estar animal, particularmente o bem-estar animal das espécies de produção, teve o seu início como área de investigação em 1965, com a publicação do Relatório de Brambell na Grã-Bretanha. Uma vez que o estudo do bem-estar animal inclui interacções a nível do animal-sistema de produção e animal-Homem, existiu desde sempre uma grande colaboração entre as ciências naturais (medicina veterinária, biologia, fisiologia) e sociais (etologia e psicologia comparativa) na investigação deste tema (Carenzi & Verga, 2009). Esta aproximação multidisciplinar levou a que o conceito de bem-estar animal fosse evoluindo ao longo do tempo. Para uma melhor compreensão do conceito é de realçar as seguintes definições: 1) Duncan (1993), "o bem-estar está dependente do que os animais sentem"; 2) Webster (1994), "o bem-estar de um animal é determinado pela sua capacidade de evitar sofrimento e manter performance"; 3) Broom (1996), que apresenta o bem-estar animal como o "estado de um indivíduo no que concerne às suas tentativas de lidar com o ambiente". Por outro lado, esta multidisciplinariedade conduziu a que a definição de bem-estar esteja envolvida por alguma polémica e tenha diferentes interpretações por parte dos consumidores, produtores e políticos (Blokhuis et al, 2008; Quintili and Grifoni, 2004; Vanhonacker et al, 2007). Nesta problemática deveremos ter ainda em linha de conta outros aspectos, como factores económicos, aspectos relativos à praticabilidade da aplicação dos conceitos na realidade das explorações e ainda, aspectos relacionados com preocupações ambientais (Wyss et al, 2004), que muitas vezes introduzem dúvidas na definição de bem-estar animal.

DE QUE FORMA PODEMOS AVALIAR O BEM-ESTAR ANIMAL NAS EXPLORAÇÕES? Uma das aproximações ao bem-estar animal mais difundidas é aquela que é feita através das "5 Liberdades", que foram apresenta-

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das pela primeira vez no Relatório de Brambell. Estas "liberdades" foram depois adoptadas e revistas pelo Farm Animal Welfare Council, mantendo-se hoje ainda como uma referência para o estudo e avaliação de bem-estar em animais de produção (FAWC, 2011). As "5 Liberdades" identificam os elementos que determinam a percepção de bem-estar pelo próprio animal e definem as condições necessárias para promover esse estado. São elas: 1. Livre de fome e de sede - acesso a água fresca de qualidade e a uma dieta adequada às condições fisiológicas dos animais 2. Livre de desconforto - fornecimento de um ambiente adequado que inclua um abrigo com uma zona de descanso confortável 3. Livre de dor, ferimentos e doença - prevenção de doenças, diagnóstico rápido e tratamentos adequados 4. Liberdade de expressar comportamento normal - fornecimento de espaço adequado, instalações adequadas e a companhia de animais da mesma espécie 5. Livre de stress, medo e ansiedade - assegurando condições e maneio que evitem sofrimento mental. A par do estabelecimento destas "5 Liberdades" é ainda importante realçar a importância do desenvolvimento de indicadores de bem-estar animal a nível das explorações (indicadores baseados no ambiente ou in-put) e dos próprios animais enquanto indivíduos (indicadores baseados no animal ou out-put). É importante realçar que estes indicadores deverão ter em linha de conta as especificidades próprias de cada sistema de produção e de cada espécie animal. A garantia do bem-estar animal de acordo com estas liberdades apenas pode ser alcançada através da aplicação de práticas de produção adequadas, que tenham em conta não só a espécie animal em si, mas também os sistemas de produção, as condições climáticas, o alojamento e as metodologias de maneio e de alimentação. No entanto, quaisquer que sejam as condições específicas presentes, a avaliação do bem-estar é um procedimento científico e deve incluir aspectos relacionados com a saúde, fisiologia, performance e medidas comportamentais (Comissão Europeia, 2000).

O IMPACTO ECONÓMICO DO BEM-ESTAR ANIMAL Os conhecimentos actuais demonstram que animais em bem-estar são mais saudáveis (Horgan and Gavinelli, 2006), e consequentemente mais produtivos, tanto em termos de quantidade como de qualidade. Por exemplo, estudos realizados em cabras demonstram uma relação directa entre a existência de afecções debilitantes, como claudicações por sobre-crescimento dos cascos, ou a existência de doenças que afectem a saúde do úbere, e uma redução significativa de produção de leite, assim como da sua qualidade (Jackson & Hac-

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kett, 2007; Mazurek et al., 2007; Anzuino et al., 2011). Além destas considerações, existe ainda uma evidência crescente de que os consumidores associam de forma clara o bem-estar animal aos conceitos de segurança alimentar e qualidade (Viegas et al., 2011). Os consumidores também demonstram de uma forma cada vez mais evidente uma preocupação ética em relação à forma como as espécies de produção são mantidas, podendo inclusive recusarse a comprar produtos resultantes de certas práticas agrícolas. Ainda outro aspecto a ter em linha de conta é legislação, que deve sofrer constante actualização em resposta às novas descobertas científicas e preocupações éticas da sociedade. De facto, desde o ano 2000, a legislação europeia nesta área tem sofrido grandes alterações, ao mesmo tempo que se tem vindo a tornar mais específica sendo de esperar que esta tendência se mantenha ou venha mesmo a aumentar.

duas áreas principais: a) criação de um modelo de certificação de bem-estar nas explorações de pequenos ruminantes através de indicadores validados; b) avaliar o impacto de certas doenças sobre o bem-estar, nomeadamente através da dor.

O PROJECTO ANIMAL WELFARE INDICATORS (AWIN)

O Bem-estar pode ser avaliado através de indicadores exibidos pelos animais

A produção intensiva de caprinos poderá trazer novos problemas de Bem-estar Animal

O Animal Welfare Indicators (AWIN) é um grande projecto europeu que vem na sequência de um outro chamado Welfare Quality. Tal como vimos anteriormente é fundamental o desenvolvimento de indicadores de bem-estar a nível das explorações. Assim, no AWIN iremos estudar os indicadores de bem-estar nas espécies que não foram abordadas pelo projecto anterior, ou seja, os ovinos, caprinos, equídeos (cavalos e burros) e ainda perus. Será ainda um dos principais objectivos do AWIN criar uma plataforma online de ensino e divulgação de temas de bem-estar animal. O AWIN é coordenado pelo Scottish Agriculture College, e envolve 11 parceiros em 10 países (9 na Europa e Brasil). Em Portugal a instituição envolvida é a Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Técnica de Lisboa. A área de estudo em Portugal será a de bem-estar de pequenos ruminantes e principalmente de cabras leiteiras em regime intensivo. Consideramos que esta é uma área de estudo que coloca verdadeiros desafios à produção animal moderna. Assistimos nos nossos dias a uma grande pressão de intensificação a nível deste sistema de produção. Na nossa opinião, há que actuar sobre esta temática a fim de evitar erros cometidos no passado a nível do melhoramento animal (por exemplo, com os bovinos leiteiros), promovendo a sustentabilidade biológica da espécie caprina. Os estudos a serem conduzidos em Portugal irão dividir-se em

No primeiro grupo de estudos pretendemos identificar os sinais que permitirão a produtores, investigadores e avaliadores reconhecer, de forma rápida e prática, problemas de bem-estar a nível das explorações. A validade, repetibilidade e exequibilidade destes indicadores de bem-estar serão testadas em diversas explorações com sistemas de produção e raças diferentes. De seguida o modelo será testado a nível dos outros países europeus. Com este estudo será possível criar as ferramentas necessárias para distinguir as explorações onde o bem-estar animal está garantido, podendo assim comunicar ao consumidor que um determinado produto respeita as normas mais exigentes de respeito pelos animais. O segundo grupo de trabalho estudará a dor em doenças e práticas de rotina como a peeira, laminite, mastites, artrites, descorna etc… Pretende-se com estes estudos perceber se a dor é uma vertente importante na patogenese das doenças e se a analgesia deverá ser considerada como parte essencial do tratamento facilitando a recuperação do animal. Daqui resultarão de certeza benefícios tanto para o animal como para a produção.

O PROJECTO AWIN E A REVISTA RUMINANTES No âmbito do nosso projecto, e em colaboração com a Revista Ruminantes, criámos um espaço onde pretendemos divulgar os nossos trabalhos, assim como outros temas relacionados com a temática do Bem-estar Animal. Acreditamos que a área do bem-estar animal é um tema que deve estar no centro das preocupações dos produtores, das empresas do sector da pecuária, e pretendemos que possam contar com o nosso projecto e equipa para responder às vossas questões e para apresentar soluções que protejam o bem-estar animal ao mesmo tempo que tornam a actividade pecuária mais produtiva.

Referências bibliográficas: Não foram incluídas por uma questão de espaço editorial, mas os autores disponiblizam bastando enviar um correio para o email.

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