Bella Andre O Olhar do Amor - Planeta

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Bella Andre. O Olhar do Amor. Tradução. Maria das Mercês de Sousa. Chase e Chloe. Os Sullivan. Livro I. O olhar do amor***.indd 5. 08 jul 2013 17:59 ...
Bella Andre O Olhar do Amor Chase e Chloe Os Sullivan Livro I

Tradução

Maria das Mercês de Sousa

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Capítulo 1

Gosto de guiar à noite, pensou Chase Sullivan, apesar de os limpa­ ‑pára­‑brisas pouco fazerem para afastar a chuva diluviana que se aba‑ tera sobre a estrada naquela noite de Maio. Já eram horas de sair da festa do septuagésimo aniversário da mãe. Oito irmãos debaixo do mesmo telhado era sinal de muita gar‑ galhada, muito encontrão e, pelo menos, duas ou três discussões. E o facto de a rapariga que Zach convidara para aquela noite ter saído com Gabe dois meses antes não ajudava nada. Juntar seis rapazes entre os vinte e sete e os trinta e seis anos tam‑ bém pode ser sinal de sarilhos. Porém, como era óbvio que nenhum estava interessado na rapariga, havia zero por cento de hipóteses de chegarem a vias de facto por causa dela. Além do mais, assim que Smith aparecera, a rapariga deixara de prestar atenção a mais alguém. Chase desatava a rir sempre que as mulheres perdiam a cabeça por causa do irmão, uma estrela de cinema. Smith era tão normal como os outros. Bem, talvez o facto de possuir um iate de trinta e tal metros e de passar a vida a enchê­‑lo de estrelas não fosse bem normal. Fosse como fosse, a festa, de facto, estivera quase a implodir por‑ que as duas irmãs gémeas não se falavam. Aliás, não precisavam, já que bastavam os olhares que lançavam uma à outra. Chase baptizara Lori, a Má e Sophie, a Boa e se não fossem cópias exactas uma da outra, ninguém diria que eram irmãs. E o que era 7

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estranho, durante a festa parecia que era a Boa quem queria assassinar a Má e não o contrário, ao ponto de esta se ter escondido da outra. Ainda bem que arranjara uma desculpa para sair antes de come‑ çarem a arrancar os cabelos uma à outra, pensou ele enquanto per‑ corria a estrada estreita que ia dar à Adega Sullivan, em Napa Valley. Nos quatro dias seguintes, Chase ia fazer uma sessão fotográfica, na adega do irmão, para a Jeanne & Annie, um atelier de moda em rápido crescimento que combinava haute couture com estilo caseiro. As modelos e a equipa ficariam na cidade, mas Chase ficaria na casa de hóspedes de Marcus. Um relâmpago iluminou o céu e se a estrada fosse suficiente‑ mente larga, Chase teria parado para tirar algumas fotografias da tempestade, já que gostava muito de chuva. As tempestades alteravam o aspecto das coisas, transformavam um campo normal num pântano cheio de aves aquáticas, por exemplo. As condições que afastavam muitos fotógrafos, em especial aqueles que dependiam de um pôr do Sol perfeito para as suas fotografias, eram as que, pelo contrário, o atraíam. Era em tais momentos, quando nada «corria bem», que a magia podia acontecer. As modelos descontraíam­‑se e deixavam­‑no aperceber­‑se de quem eram na realidade. Chase acreditava que tinha de haver uma verdadeira ligação emocional com a máquina fotográ‑ fica para se poder captar a verdadeira beleza, para além da da roupa, das jóias ou dos sapatos. É claro que no início da sua carreira, rodeado por tanta beleza física, Chase portara­‑se como qualquer outro homem. A princípio fora um dos bónus do trabalho, mas ao aproximar­‑se da casa dos trinta anos o fotógrafo apercebera­‑se de que o sabor da noite durava apenas oito horas, enquanto as fotografias eram para sempre e abran‑ dara um pouco. Devido, em parte, às suas recentes viagens à Ásia e ao facto de não ter ninguém que lhe aquecesse o motor, Chase estava em jejum havia mais de um mês. O  fotógrafo tencionava quebrar o feitiço naquela noite com Ellen, uma das executivas de Marcus que conhecera 8

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quando tratava dos pormenores da sessão de fotografias. Aliás, o médico aconselhara­‑lhe uma noite de pura diversão sem amarras. Por um triz não via a luz vacilante na berma da estrada. Nos últi‑ mos trinta minutos não passara por carro nenhum porque numa noite como aquela a maioria dos californianos ficava em casa. Chase abrandou e virou a frente do carro para ver melhor. Não só estava um carro na valeta, como havia uma mulher a caminhar pela estrada fora, a cerca de cem metros de distância. Ao ouvir o carro a aproximar­‑se, a mulher virou­‑se e ele, à luz dos faróis, viu­‑lhe os cabe‑ los colados à testa e aos ombros. Perguntando a si próprio por que razão não ficara dentro do carro, seca e quente, à espera do pronto­‑socorro, Chase encostou e saiu para tentar ajudá­‑la. A mulher tremia. – Está ferida? – Não – respondeu ela, tapando a face com a mão e abanando a cabeça. O fotógrafo teve de se aproximar para conseguir ouvi­‑la por cima do barulho do granizo no pavimento. Apesar de ter desligado os faróis, os seus olhos adaptaram­‑se depressa à escuridão e puderam ver­‑lhe o rosto. Chase sentiu um aperto no coração. Apesar dos cabelos encharcados, apesar do aspecto de náufraga, a beleza da mulher espantou­‑o e num instante o seu olho de fotógrafo catalogou­‑a. A boca era um pouco grande de mais, assim como os olhos. A mulher estava longe de ter a magreza necessária a uma modelo, mas pela maneira como a T­‑shirt e os jeans se lhe colavam à pele, era evidente que sabia tirar partido das curvas que a natureza lhe dera. A escuridão não deixava ver­‑lhe a cor dos cabelos, mas pareciam sedosos e lisos. Chase só se apercebeu de que perdera o fio à meada quando a ouviu acrescentar: – Mas o meu carro está. Consciente de que estivera a comê­‑la com os olhos, o fotógrafo ten‑ tou recompor­‑se e ao mesmo tempo apercebeu­‑se de que tivera razão em relação ao carro acidentado. Não era preciso ser­‑se mecânico, como 9

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o irmão Zach, para verificar que o veículo, uma carrinha, era um caso praticamente perdido porque além do pára­‑choques, des­truído pela cerca em que embatera, os pneus, carecas, não conseguiriam tirá­‑la do atoleiro em que estava sem ajuda, pelo menos naquela noite. Se a situação não fosse tão precária, Chase tê­‑la­‑ia mandado esperar no interior da carrinha enquanto tentava desatolá­‑la, mas um dos pneus traseiros estava sem apoio. – Entre no meu carro. Esperamos lá dentro pelo pronto­‑socorro – disse, consciente de que as suas palavras soaram quase como uma ordem, mas também consciente de que a chuva se transformara em granizo. E tinham de se abrigar antes que gelassem. A mulher, porém, não se mexeu e lançou­‑lhe um olhar de descré‑ dito, como se fosse maluco. – Desculpe, mas eu não entro no seu carro. Apercebendo­‑se de que, de facto, devia ser assustador para uma mulher ver­‑se sozinha numa estrada, à noite, Chase deu um passo atrás e disse­‑lhe em voz alta por causa do granizo: – Juro que não lhe faço mal. A mulher encolheu­‑se e o radar de Chase começou a zumbir. O fotógrafo nunca se sentira atraído por mulheres em sarilhos, não era homem para tratar de aves feridas, mas depois de viver tantos anos com duas irmãs, percebeu que havia qualquer coisa que não estava bem. Aquela mulher tinha um problema qualquer para além do carro atolado na lama. Chase ergueu as duas mãos, desejoso de que se sentisse segura. – Juro sobre a campa do meu pai que não lhe faço mal. Pode entrar no meu carro à vontade. Quando a mulher não disse de imediato que «não», ele aproveitou: – Juro que só quero ajudá­‑la. E era verdade. Fazia pouco sentido, mas Chase queria ajudar aquela estranha. Ela olhou para ele por um longo momento, rodeada pela chuva intensa e ele viu­‑se a prender a respiração, à espera da sua decisão, quando se devia estar nas tintas. 10

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Chloe Peterson nunca se sentira tão molhada, tão miserável e  tão… desesperada; havia várias horas que vinha a ultrapassar o limite de velocidade, mas de repente começara a chover torrencial‑ mente e, apesar de ter abrandado, os pneus carecas atiraram o carro para aquela maldita vala enlameada. Seria mais fácil – e mais inteligente – ficar no carro à espera que a tempestade passasse, mas estava demasiado nervosa para estar quieta; tinha de se manter em movimento e pusera o saco ao ombro e saíra no momento em que a chuva se transformara em granizo. Estava frio e as pequenas pedras magoavam­‑na, mas não se importava porque a situação permitia­‑lhe abstrair­‑se do que lhe acon‑ tecera algumas horas antes. Chloe não sabia bem onde estava ou para onde ia, apenas que tinha esperança de ir na direcção da cidade. As estradas haviam estado desertas a noite toda, o que era estra‑ nho, mas mal se começara a afastar do carro, uns faróis começaram a iluminá­‑la por trás. Quando o carro parara, o medo apossara­‑se dela por estar sozinha numa estrada secundária, molhada e sem telemóvel. Aliás, mesmo que tivesse telemóvel, não devia conseguir sinal por causa daquela maldita tempestade. E então o homem, um homem grande, aproximara­‑se e dissera­ ‑lhe para entrar no seu carro. Era o que faltava. Tentara convencê­‑la de que não lhe faria mal, mas ela conhecia os homens, sabia que eles diziam uma coisa e que depois faziam outra. – Não o conheço de lado nenhum – disse­‑lhe, pensando que podia ter na sua frente um assassino e que tinha pés para andar; aca‑ baria por arranjar um sítio qualquer para se secar. Chloe viu a frustração no rosto do homem e percebeu que ia continuar a tentar chamá­‑la à razão, mas de repente ouviram­‑se uns pneus a derrapar e antes que percebesse o que acontecia, a rapariga 11

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viu­‑se nos braços dele e fechou os olhos, à espera do impacte, mas o homem, sem qualquer esforço, saltou para a valeta com ela, ao mesmo tempo que a moto desaparecia a toda a velocidade. – Sente­‑se bem? Chloe levantou os olhos e pela primeira vez, desde que saíra do carro, percebeu que estava na presença de um homem extremamente atraente. Não, admitiu para si própria, sentindo o seu corpo a reagir, ­atraente era pouco. Até na escuridão dava para perceber que, alto como era, envergonhava todos os homens e que, apesar da chuva, era de uma beleza extraordinária. Ou talvez, pensou, a reacção tivesse a ver com o facto de ainda não a ter largado. Noutra noite qualquer, a maneira como se afastara da mota com ela nos braços fá­‑la­‑ia perder a desconfiança, mas naquela… Sã e salva, Chloe tentou levantar­‑se para pôr os pensamentos em ordem e tomar uma decisão racional. – Espere um momento, que já a tiro daqui. Um momento mais tarde Chase, pousou­‑a na berma da estrada. – É melhor não continuarmos aqui. Não é seguro. O senso comum dizia­‑lhe que ele tinha razão, mas também lhe dizia para ter cuidado. Por outro lado a rapariga não tinha outra hipótese. – Está bem, pronto, eu entro no seu carro – disse Chloe na espe‑ rança de não se enganar, pensando que, no fundo, o homem sempre a salvara.

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